De como Deus lambe o copo
Ontem encontrei Deus tomando um conhaque no bar do Kim Caveira. Olhou pra mim como se sentisse reconhecido, deixando um meio sorriso transparecer nos olhos avermelhados e pouco visíveis. Sentei à sua frente, olhando-o com o carinho de quem surpreende um velho amigo longe de sua rotina. E esperei que ele tomasse outro trago:
- Como me descobriu? – ele me perguntou depois de pousar o copo sobre a madeira gasta da mesa.
- Pelas marcas de nuvens carmins nos dedos - respondi sem respirar – é a mesma cor que o Senhor usou hoje, na tarde.
- Pois é! Ainda bem que não tem muitos poetas por aqui, senão, estaria fudido. Aceita um conhaque?
- Só se o senhor prometer que não vai deixar minha úlcera doer depois.
Ele riu, e fez sinal ao caveira para que nos trouxesse novas doses.
- Desde que você não misture com cerveja... – e vez um gesto ébrio de benção.
- Você continua só pintando? – perguntei.
- E coçando o saco – disse rindo depois de secar seu copo. E acrescentou – Jesus cuida dos negócios esplendorosamente bem. Já não é mais aquele revolucionário sonhador e romântico de milênios atrás. Caralho!, até hoje ainda tenho que ouvir reclamações a respeito de promessas absurdas que ele fez à esse povo inocente. Agora ele aprendeu que essa coisa de satisfazer vontades de pessoas que não sabem o que querem é trabalho de outros departamentos: prefeituras, igrejas, inferno...
Caveira aproximou-se com as bebidas. Passou um pano úmido para tirar o excesso de marcas de água deixadas pelo copo de Deus e saiu cantarolando um reggae.
- Deus, porque que o céu é azul?- perguntei depois de sair da cara feia, provocada pelo o conhaque que desceu me queimando.
Ele riu com a boca ainda cheia, fazendo esforço para não cuspir, sorveu o líquido com paciência e voltou-se pra mim com candura:
- Engraçado!, ontem um coelho me fez a mesma pergunta. Só que em vez de azul, rosa choque.
- Rosa choque?!!!
- É, os coelhos são meio gays.
- E os padres também, né? – acrescentei às gargalhadas.
- O pior é que é! – ele consentiu com certo constrangimento.
Uma negra muito bonita se aproximou dele e cochichou em seu ouvido algo que o fez corar:
- Eu também te amo, mas se você beber mais , vai...
E lhe falou em surdina alguma coisa que deu à ela uma expressão de arrependimento e angústia. A negra nos deixou cabisbaixa e ganhou a rua com uma velocidade parecida com o desespero.
- Veja bem – recomeçou – para me poupar trabalho, eu criei tudo com seu próprio sistema de criação. Então é só da corda que as coisas avançam em princípios parecidos com os meus. Assim, tudo que você vê, é a repetição de um eco que vaga em suas entranhas desde o sopro primordial. Mas tem um detalhe, os outros não vêem o que você acha que está transmitindo. Nisso Eu fui sacana. Há um borrão nos olhos, quase todos, que transfigura a imagem emitida, é uma espécie de ilusão, assim, o que se vê, geralmente, é o contrário do que é na verdade. Entendeu?
- Não.
- Os negros, a maioria, são pessoas muito claras; os anões, são grandes homens...
- E o céu então é vermelho? – eu disse, fazendo cara de quem descobriu o segredo de todos os mistérios.
- Seu problema é que você não sabe beber! Confunde-se à-toa. É claro que o céu não tem cor.
- E essas marcas carmins no seu dedo então?
- Puta que pariu! Como você é burro. Não tá vendo que minhas mãos são de pintor porque você não sabe pintar. Tudo que não se pode ter parece divino. O homem sempre criará seus céus e infernos a partir de seus medos e desejos. No paraíso dos evangélicos tocará hinos o tempo todo, no seu inferno também... Compreendes companheiro!
- Então por isso que o Stephen Hawking é feio daquele jeito? Só porque é mais inteligente que todo mundo?
- Não. Aquilo é uma sacanagem que fazem com o coitado. Há muito tempo que ele não passa de um monte de carne torta que não consegue reagir a nada. Mas uns ingleses que não querem ser responsáveis por tanta informação insegura, insistem em usá-lo como testa de ferro, assim como os católicos fazem com o Papa. Se os infelizes pudessem gritar...
- E você permite isso assim!
- Se eu interferisse, o Hawking morreria por não conseguir pedir esmolas e o Papa... é um castigo mesmo, ser conivente com um sistema daqueles!, vê se pode?
- Porra Deus, o Senhor é foda mesmo! Me paga outro conhaque.
- Só se prometer que não vai dizer nada do que te falei aqui. Ou então sua úlcera nunca mais melhorará. Promete?
- Claro! Sou seu fã.
- Oh Caveira! Mais dois conhaques por favor!
- Com gelo e limão? - perguntou Kim Caveira em sinal de prontidão.
- Que merda!- resmungou Deus – ele parece que quer testar minha paciência. – e depois num tom alto e cheio de graça - Não, meu filho, purinho, purinho!
j. gauche
- Como me descobriu? – ele me perguntou depois de pousar o copo sobre a madeira gasta da mesa.
- Pelas marcas de nuvens carmins nos dedos - respondi sem respirar – é a mesma cor que o Senhor usou hoje, na tarde.
- Pois é! Ainda bem que não tem muitos poetas por aqui, senão, estaria fudido. Aceita um conhaque?
- Só se o senhor prometer que não vai deixar minha úlcera doer depois.
Ele riu, e fez sinal ao caveira para que nos trouxesse novas doses.
- Desde que você não misture com cerveja... – e vez um gesto ébrio de benção.
- Você continua só pintando? – perguntei.
- E coçando o saco – disse rindo depois de secar seu copo. E acrescentou – Jesus cuida dos negócios esplendorosamente bem. Já não é mais aquele revolucionário sonhador e romântico de milênios atrás. Caralho!, até hoje ainda tenho que ouvir reclamações a respeito de promessas absurdas que ele fez à esse povo inocente. Agora ele aprendeu que essa coisa de satisfazer vontades de pessoas que não sabem o que querem é trabalho de outros departamentos: prefeituras, igrejas, inferno...
Caveira aproximou-se com as bebidas. Passou um pano úmido para tirar o excesso de marcas de água deixadas pelo copo de Deus e saiu cantarolando um reggae.
- Deus, porque que o céu é azul?- perguntei depois de sair da cara feia, provocada pelo o conhaque que desceu me queimando.
Ele riu com a boca ainda cheia, fazendo esforço para não cuspir, sorveu o líquido com paciência e voltou-se pra mim com candura:
- Engraçado!, ontem um coelho me fez a mesma pergunta. Só que em vez de azul, rosa choque.
- Rosa choque?!!!
- É, os coelhos são meio gays.
- E os padres também, né? – acrescentei às gargalhadas.
- O pior é que é! – ele consentiu com certo constrangimento.
Uma negra muito bonita se aproximou dele e cochichou em seu ouvido algo que o fez corar:
- Eu também te amo, mas se você beber mais , vai...
E lhe falou em surdina alguma coisa que deu à ela uma expressão de arrependimento e angústia. A negra nos deixou cabisbaixa e ganhou a rua com uma velocidade parecida com o desespero.
- Veja bem – recomeçou – para me poupar trabalho, eu criei tudo com seu próprio sistema de criação. Então é só da corda que as coisas avançam em princípios parecidos com os meus. Assim, tudo que você vê, é a repetição de um eco que vaga em suas entranhas desde o sopro primordial. Mas tem um detalhe, os outros não vêem o que você acha que está transmitindo. Nisso Eu fui sacana. Há um borrão nos olhos, quase todos, que transfigura a imagem emitida, é uma espécie de ilusão, assim, o que se vê, geralmente, é o contrário do que é na verdade. Entendeu?
- Não.
- Os negros, a maioria, são pessoas muito claras; os anões, são grandes homens...
- E o céu então é vermelho? – eu disse, fazendo cara de quem descobriu o segredo de todos os mistérios.
- Seu problema é que você não sabe beber! Confunde-se à-toa. É claro que o céu não tem cor.
- E essas marcas carmins no seu dedo então?
- Puta que pariu! Como você é burro. Não tá vendo que minhas mãos são de pintor porque você não sabe pintar. Tudo que não se pode ter parece divino. O homem sempre criará seus céus e infernos a partir de seus medos e desejos. No paraíso dos evangélicos tocará hinos o tempo todo, no seu inferno também... Compreendes companheiro!
- Então por isso que o Stephen Hawking é feio daquele jeito? Só porque é mais inteligente que todo mundo?
- Não. Aquilo é uma sacanagem que fazem com o coitado. Há muito tempo que ele não passa de um monte de carne torta que não consegue reagir a nada. Mas uns ingleses que não querem ser responsáveis por tanta informação insegura, insistem em usá-lo como testa de ferro, assim como os católicos fazem com o Papa. Se os infelizes pudessem gritar...
- E você permite isso assim!
- Se eu interferisse, o Hawking morreria por não conseguir pedir esmolas e o Papa... é um castigo mesmo, ser conivente com um sistema daqueles!, vê se pode?
- Porra Deus, o Senhor é foda mesmo! Me paga outro conhaque.
- Só se prometer que não vai dizer nada do que te falei aqui. Ou então sua úlcera nunca mais melhorará. Promete?
- Claro! Sou seu fã.
- Oh Caveira! Mais dois conhaques por favor!
- Com gelo e limão? - perguntou Kim Caveira em sinal de prontidão.
- Que merda!- resmungou Deus – ele parece que quer testar minha paciência. – e depois num tom alto e cheio de graça - Não, meu filho, purinho, purinho!
j. gauche
1 Comentários:
Às domingo, 17 setembro, 2006 , FLORA disse...
Nem comentei...Mas já li esse texto umas trE^s vezes...Um dos meus prediletos...Perfeito...
Postar um comentário
Assinar Postar comentários [Atom]
<< Página inicial