vinteesete

02 novembro, 2008

o desespero da linha reta

Para me ater ao pouco
Nos poucos traços do mínimo
Para me atentar apenas ao menor e parar
Para que eu não me exceda
E diga o quanto eu realmente me importo
Para que eu finja
E minta sobre lugares que nunca fui
Sobre prazeres que nunca senti
Para que eu demore mais tempo sonhando
E só acorde depois que o corpo estiver farto
Para que eu sorva cada palavra e seus sentidos
E possa guardá-las direitinho
Para que todas as horas tenham seu registro íntimo
E no futuro dos outros eu esteja presente
Para que eu burle essas regras simples da moral
E fale sobre o prazer de cada vício
Uma lista de coisas a se fazer com o próprio corpo
E o endereço da luciana ventania
Para contar o quanto tenho sorte
Para dizer o quanto o mundo é mágico e besta
E fazer desse monte de delírios um lugar secreto para se visitar nas horas de tédio
E deixá-lo à disposição
Para que depois eu não diga que a vida é assim
Que quando finalmente se sabe sobre tudo
Já é tarde
Para que eu saia por aí fazendo coisas sem saber exatamente o que faço
Para que eu erre com as devidas desculpas
Para que eu falhe
E esteja errado quando digo a mim mesmo que eu não posso
Para que eu possa e faça
E me deite nas águas mornas dos rios do interior
Nos lençóis esterilizados dos hotéis do mundo
E nunca me pergunte pelo depois
E seja leve
Para que, um dia desses, eu acorde ainda meio tonto e me lembre de quase nada e deixe confortavelmente o tempo seguir seu fluxo e me afogar lentamente sem muito o que dizer e fazer e constatar que se é o mesmo depois de passar por todas essas coisas desconfortáveis que nos fazem mais secos e frios e velhos
E não lamentar
Para não parecer fraco e burro
E nem querer
Para não ter que brigar por algo que depois me decepcionará
Só me atentar ao delírio
À vontade
À alucinação
Ao desejo satisfeito na hora em que ele surge
Para olhar para frente
E não ver nada e não querer ver nada
Para ir assim sem parar

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